2 de agosto de 2012

As Mil e Uma Noites : Um Conto sobre a Riqueza e a Pobreza





Scheherazade, a Iluminada filha do vizir que encantou o sultão com suas histórias maravilhosas, durante mil e uma noites...com o objetivo de entreter seu rei e assim salvar todas as moças do reino de serem cruelmente assassinadas.....e num sentido mais amplo, todos nós,  toda a Humanidade... 

Scheherazade, que o Ocidente, com seu materialismo, não compreendeu como deveria, o tamanho da riqueza de suas histórias e de sua própria lenda.....

...Nos deixou esse lindo conto, que reproduzo aqui, e que trata de Destino, Sincronicidade, acaso, mérito, pobreza e riqueza, materiais e espirituais, entre tantas outras coisas.

Conto-diamante da incomensurável riqueza cultural e espiritual dos povos árabes e que chegou, depois de milhares de anos, como joia indestrutível, até nós.

Era uma vez dois velhos sábios, que sempre filosofavam sobre a vida.
Estavam  os dois, certo dia, a discutir sobre as causas da pobreza : se esta era consequência do destino,  se era predestinada ou se era fruto de falta de visão e mau uso das oportunidades que a vida oferecia.
E se, caso ou outro, o indivíduo poderia reverter essa situação de ser pobre, seja por méritos adquiridos, empenhos ou por uma espécie qualquer de recompensa do Destino.

Resolveram então testar o que pensavam.

Havia no lugarejo um homem chamado Hassam, muito pobre, casado e com muitos filhos.
Resolveram os dois sábios doar-lhe uma boa quantidade de joias, para ver o que acontecia.

Hassam  então recebeu alegremente as joias  mas, com medo de ser roubado, escondeu-as em seu turbante.
Pegou no sono e eis que vem uma porção de corvos e....levam embora o turbante recheado de joias!
Hassam, desesperado, correu para contar aos sábios o azar que a ele sucedera.

Os sábios, espantados, resolveram que desta vez dariam boa quantia em moedas de ouro a Hassam.
E assim foi feito. Entregaram-lhe as moedas de ouro e Hassam as levou para casa.
Mas, com medo de ser roubado, Hassam as escondeu dentro de um pacote de farelo de ração para animais e saiu para a cidade.
Sua esposa estava em casa e, procurada por alguns viajantes que precisavam de ração para seus animais, ela, sem saber, vendeu algumas sacas de farelo a eles e entre elas, a saca com as moedas de ouro escondidas pelo marido.
Qual a surpresa para Hassam, ao chegar em casa, e saber da fatalidade!!!
Foi novamente, desesperado, reclamar aos sábios de mais uma peça que o Destino lhe pregara.

Os sábios, ainda firmes em seus propósitos, resolveram então que desta vez dariam a Hassam um simples pedaço de chumbo, mas que dentro dele estaria escondida uma raríssima e valiosa joia, sem que Hassam soubesse disso.
Hassam então pegou o pedaço de chumbo, sem saber o que havia dentro, e o levou para casa.

Estava em companhia da mulher e dos filhos quando chegou seu vizinho, um antigo pescador do lugarejo.

Este lhe disse:
 _ Hassam, ontem eu tive um dia terrível. Minha rede se rompeu e não tenho como consertá-la, o que me impedirá de pescar e levar alimento para minha família. Se eu tivesse um bocado de chumbo, poderia consertá-la.....
Prontamente, Hassam lhe ofereceu o chumbo que ganhara dos sábios, deixando o pescador na mais pura alegria, dizendo-lhe:
_ Obrigado amigo, e prometo-te que, depois de consertada minha rede e lançada ao mar, o primeiro peixe que hoje eu pescar, será teu.

E assim, o pescador usou o chumbo de Hassam no reparo da rede que, lançada ao mar, pescou muitos peixes e o primeiro deles, conforme prometido, foi entregue a Hassam como símbolo da mais pura gratidão.

Hassam recebeu alegremente o peixe e enquanto o cozinhava, percebeu um imenso brilho dentro dele.
Era um diamante enorme, jamais visto em toda a redondeza, joia que Hassam logo vendeu a um mercador estrangeiro por muito, muito dinheiro.

Com o dinheiro, Hassam comprou muitos animais e também ração para eles e eis! 
Entre tantos e tantos pacotes de farelos comprados, lá estava a saca com as moedas de ouro que havia escondido, intactas, aquela saca que sua esposa havia vendido para os viajantes.
Hassam, com as moedas de ouro recuperadas, comprou uma casinha e ao mudar-se para ela viu seu filho mais velho correndo, vindo do quintal, trazendo na mão um ninho de corvos e um....turbante.... recheado de joias......

Esse lindo e comovente conto não fala da riqueza material, porque é uma parábola sobre a riqueza espiritual, o conhecimento interior, as virtudes, os talentos que, se usados e colocados em prática, traçam o nosso destino.

Os dois sábios, no conto, podem  representar Deus, o Universo, a Vida, doando essas virtudes, esses talentos (as joias, as moedas) a alguém que não as utiliza;  ao contrário, as esconde, “com medo de ser roubado”.

O Acaso, ou o acaso que não é acaso, mas sim uma Sincronicidade, arrumou um modo para que corvos, viajantes e pescadores com rede quebrada aparecessem na vida do protagonista do conto, para retirar o que ele havia ganhado ou para devolver a ele o que havia sido perdido.
Hassam, pelo seu caráter medroso e egoísta, escondeu esses talentos simbólicos e os perdeu.
Quando recebeu a joia oculta, envolta num simples chumbo sem valor material, não temeu ser roubado e foi aí que teve a chance de modificar suas atitudes e mudar seu Destino, quando doou, de coração, o metal ao pescador.

Talvez aí resida o mistério do Destino: nós o construímos com nossas intenções: conscientes ou inconscientes, expostas ou veladas.
Esses talentos, essas virtudes, joias que nos foram dadas, não para serem escondidas, mas compartilhadas, devem ser divididas, passadas adiante: devem tocar os outros e também mudar seus destinos, como Hassam mudou o seu e o do pescador.

Seriam tesouros que escondemos,  por “medo de sermos roubados” ?

Certamente essas virtudes podem se manifestar em diversas formas, tanto em um tipo de arte, profissão, atividade ou através das habilidades que possuímos, que teimamos em desprezar,  e que muitas vezes são como o chumbo-diamante da história : acreditamos que não possuem valor algum, mas servem para um pescador que não tem como consertar sua rede e lançá-la ao mar.

Esse conto nos leva a pensar que joia oculta carregamos sob o metal pesado, sob nossos medos, julgamentos, orgulhos, vaidades, preconceitos, tanto em relação aos outros, à Vida e mais importante: sobre nós mesmos ; aquelas riquezas imensas que temos dentro de nós, envolta por padrões petrificados, assimilados,  e que, se fossem essas riquezas compartilhadas, de coração,  seriam capazes de enriquecer nossa alma, a de muitos outros e por consequência, mudar nosso Destino.

O que nos é dado, doado, lá do Alto, não só a nós pertence.

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