10 de maio de 2011

Você vai Conhecer o Homem dos seus Sonhos - When You Whish Upon a Star


Confesso que assisti a esse filme de Woody Allen depois de ler uma série de críticas negativas a respeito dele, e de ouvi-las também!

Que um dos mestres do cinema tinha feito um filme pequeno; que era um filme pessimista sobre o amor; que mostrava, com muito humor negro, a realidade patética das pessoas em busca da felicidade amorosa, etc, etc, etc.

Não sou crítica de cinema, nem crítica de coisa alguma nessa vida, nem especialista nisso ou naquilo, muito menos conhecedora de Allen, mas ao longo do tempo adquiri um olhar que os psicanalistas chamam de pensamento mágico, próprio dos loucos e das crianças...os céticos chamam a isso de olhar alienado e eu e meus irmãos e irmãs de Trajetória, um olhar místico, um jeito ocultista de ver as coisas, inclusive, alguns filmes.

Tal é a razão desse blog.

Esse olhar...

Pois bem.

É com esse olhar “lunático” que vejo as coisas e fiquei um tanto surpresa com o final do filme.

E foi com a empolgação desses olhos que resolvi escrever este texto, embora goste muito de cinema.

Acho, de certa forma, que os críticos estavam certos: Allen quis mostrar a realidade nua e crua da busca do amor e a dureza da vida e seus golpes infames, mas creio que seu inconsciente o traiu (?), ou talvez Woody Allen tenha se cansado da Psicanálise (?), ou quis mesmo debochar dos místicos (?), ou tudo isso junto, sei lá o que ele pretendia, mas me prendi a um detalhe o tempo todo: a personagem Helena, a “lunática”, a “alienada”, a “sonhadora”, a cheia de “pensamento mágico”, a nada, a nadinha realista Helena, mas de alma verdadeira, como Jonathan, que aliás, diga-se de passagem, são os dois maravilhosos lunáticos da trama.

Se você não viu o filme e pretende vê-lo, nem continue a ler esse artigo, porque vou contar o filme inteirinho e estragar completamente a surpresa preparada no final do filme.

Retome-o, caso tenha interesse, depois de assisti-lo.



Então vamos lá.



O filme começa com uma linda canção, “When you whish upon a star”, interpretada por Leon Redbone.

Linda, perfeita para gente como eu, lunática!!!

Um narrador onipresente começa dizendo que “a vida é uma história contada por um louco, cheia de som e fúria, significando nada”, citando Shakespeare.

E então, ele começa a apresentar o drama dos personagens.

Na Londres contemporânea, Helena (a ótima Gemma Jones) é casada há 40 anos com Alfie (Anthony Hopkins) e este, com medo da já chegada idade, tem um súbito “impulso juvenil” e daí procura por academias, malhação, bronzeamentos, vitaminas e para se divorciar de sua mulher, a dedicada Helena, mãe de sua filha, é um rápido passo.

Conhece a clássica loira-burra-jovem-linda-exploradora-oportunista-vulgar-sedutora-troféu, a garota de programa Charmaine (a engraçadíssima Lucy Punch) que logo, logo, faz morreeeerrr de inveja, como era de se esperar, seus amigos & vizinhos & colegas de trabalho, pela recém - conquistada carne fresquíssima.

Trivial, não?

Dá a ela casacos de pele, jóias e um apartamento no mais badalado bairro de Londres e como era também de se esperar, se atola em dívidas, Viagras e chifres.

Helena, sua ex-mulher, temendo os dias que virão, procura por uma vidente, que faz as mais belas previsões sobre seu futuro : “Você vai conhecer o homem de seus sonhos”, ela diz, e entre outras profecias alentadoras para Helena, prevê também o futuro de seu genro e de sua filha, Sally, previsões, aliás, nada agradáveis.

Sally (Naomi Watts), filha de Helena e Alfie, é casada com Roy (Josh Brolin), um quase quarentão que há muito tempo abandonou (ou melhor, nunca exerceu) a Medicina para ser escritor.

O problema é que só escreveu um único livro de sucesso e depois disso, nunca mais conseguiu escrever nada que alguma editora ao menos aceitasse publicar.

Ele vive às custas de Sally, que trabalha na galeria de arte de Greg, um homem sedutor, bonito e bem sucedido, mas casado (Antonio Banderas).

As brigas entre o casal são frequentes, porque Roy não consegue terminar o que seria seu segundo livro promissor, está desempregado e o salário de Sally não cobre todas as despesas da casa, tendo que recorrer à ajuda financeira de Helena, sua mãe.

Então Roy passa a paquerar a vizinha de apartamento, Dia (Frida Pinto), jovem, bonita, porém com casamento marcado, e esta logo se transforma em sua “musa inspiradora”, desse seu livro que nunca termina.

Sally, por sua vez, se vê apaixonadinha pelo patrão Greg, que não passa do clássico cafajeste cuja mulher “não o entende”, que “o casamento vai mal”, mulher essa que “é bipolar, problemática, tadinha”, que “não se separa por causa das crianças”, etc, etc, etc..., conversinha bem conhecidinha desde que existem seres humanos na Terra, mas os dois, Greg e Sally, não chegam a ter um caso, apenas flertes, embora Sally queira muito e fantasie ter esse caso com ele.

Seria ótimo para ela trocar o fracassado marido-escritor- desempregado pelo bem sucedido, bonito e sedutor Greg...

Mas, voltemos ao pai dela, Alfie.

Alfie descobre que sua loira - vários adjetivos - troféu o trai continuamente e está grávida (e ele, obviamente não tem certeza se é o pai).

Já endividado, procura a ex-mulher Helena e ela não o quer de volta.

Sally descobre que o patrão-bonitão-perfeitão Greg está tendo um caso com sua amiga artista Iris (Anna Friel) e que todas as lorotas que ele contou a ela sobre seu casamento contou a amiga também.

Mesmo assim, Sally sente que perdeu um partidão, que se tivesse dado mais sinais, talvez, sido mais “atirada”, quem sabe ela poderia ter se tornado sua amante, ao invés da amiga.

A essa altura, seu marido Roy já seduziu a vizinha.

Depois de ter o segundo livro finalmente terminado e rejeitado pela editora, Roy resolve roubar o livro escrito por um amigo que, num primeiro momento, pensava que havia morrido num acidente de carro, mas que depois descobre estar em coma; livro este que só Roy tinha conhecimento, tinha lido e achado espetacular.

Não pensa duas vezes: invade a casa do amigo em coma e apresenta o livro à editora como se fosse seu.

Claro: conquista de vez a jovem e volúvel vizinha, a família inteira da moça, que rompe o noivado às vésperas do casamento para ficar com o “talentoso escritor” Roy que, através de uma farsa e de um roubo, agora torce para que o amigo nunca saia do coma, para que acabe morrendo mesmo e que assim não possa reivindicar a autoria do livro que lhe deu prestígio, fama, dinheiro e o amor de uma moça enganada, que estava prestes a subir ao altar para se casar com outro homem, talvez, quem sabe, seu verdadeiro amor.

E Helena?

A lunática, louca, alienada, criticada, a tresloucada e sonhadora Helena passa os dias consultando Cristal (Paulinne Collins), a vidente, tida por todos como charlatã.

Acredita que vai encontrar o homem de seus sonhos, mesmo sendo uma senhora de idade....mesmo depois de 40 anos num casamento....acredita que vai conhecer um estranho que aparecerá em sua vida, de repente, vindo do nada, parecido com ela, com a mesma espiritualidade que a dela, como diz a vidente Cristal.

Sally alimenta as esperanças da mãe, talvez por piedade, talvez para conseguir dela o empréstimo que tanto quer para montar sua própria galeria de arte...

Alimenta essas esperanças, mas odeia quando a mãe fala sobre o futuro dela e de seu marido, Roy.

Crê firmemente que a mãe não passa de uma senhora maluca que precisa urgentemente de um psiquiatra...

Mas Helena só ouve a vidente Cristal e seu coração lunático...

Até que um dia...

Até que um dia conhece Jonathan (Roger Ashton-Griffiths).....um senhor dono de uma livraria de Ocultismo, viúvo e ainda com fixação pela falecida mulher, com a qual tenta contatos espirituais.

Helena não tem a princípio o amor-padrão-revelado de Jonathan; possui sua amizade e companheirismo, pois, em se tratando de amor, acredita que competir com uma morta é tarefa difícil....mas continua o encontrando; saindo com ele e conversando muito.

E Helena, a lunática, a que crê nas estrelas, em fadas, em cartas, em reencarnação, em astrologia, é finalmente pedida em casamento por Jonathan, obviamente, depois da “autorização” da falecida, por meio de contatos espirituais.

Sally fica sozinha e sem montar sua tão sonhada galeria....e sem ter um caso com o bonitão-perfeitão-mentirosão Greg, seu patrão.

Alfie (continua ou não, não se sabe), com sua loira-golpista-troféu, prenha de outro homem, endividado e envergonhado.

Iris vira amante do sedutor e mentiroso Greg, que provavelmente deve ter outras na sua coleção, assim como as obras de arte em sua galeria.

Roy, mergulhado numa nojenta farsa, reza para que o amigo nunca saia do coma e revele a origem do livro que não é seu, da fama que não é sua, do dinheiro que não lhe pertence e do amor de uma mulher que nunca deveria tê-lo amado.

E Helena e Jonathan, os lunáticos que acreditam nas estrelas, em reencarnação, em tarots, em Ocultismo, em bruxas e em Destino, ficam juntos no final ....ao som da fantástica e irresistível “When you whish upon a star”.....

E assim termina esse estranhíssimo e belo (?) conto de fadas de Woody Allen; belo e conto de fadas para mim, uma lunática, como Helena e Jonathan.

E a vidente Cristal estava certa, em tudo que disse.

O filme acabou e fiquei rindo, rindo um riso de revanche.

Nada contra os realistas, longe disso!

Mas é que aquele champanhe no parque....e aquela conversa mística de Helena e Jonathan no final do filme....foram deliciosos demais!!!

Eu estava lá, comemorando com eles!!

Afinal, os “alienados”, os lunáticos, venceram no final.

Fiquei imaginando Helena ajudando Jonathan em sua livraria de Ocultismo e em quanta coisa ela iria ler, fuçar, encomendar para a loja, procurar em sebos, enfim... tanto conhecimento se abrindo para ela, assim, de um modo inusitado, mas esperado em seu coração; quantas conversas maravilhosas teria com os clientes; e depois, no final do dia, ela e Jonathan, indo para casa, felizes, pensando como eram especiais por terem encontrado um ao outro; para Jonathan, que sua falecida Claire devia estar contente por seu casamento com Helena e esta, por sua vez, dando graças a Deus por ter se livrado de um idiota vazio e fútil como Alfie e por ter encontrado....

O homem de seus sonhos!! (sortuda!!!)

E os outros personagens, mereciam encontrar o amor?

Mentiras.

Esse era o universo deles.

Um mundo de luxo, poder, dinheiro, fama, eterna juventude, status social, sucesso, beleza e muita, muita futilidade.

Todos os personagens realistas, pés no chão, afundados até o pescoço na realidade, essa realidade cheia de falsidades e futilidades, continuaram nas mesmas mentiras nas quais viviam.

Que paradoxo, não?

Esse é o mundo de todos os personagens, exceto o de Helena e Jonathan.

Eles, apenas eles, alimentavam uma esperança baseada na inocência, na doçura, na Verdade Interior que era motivo de riso e deboche dos realistas, seguidores dos manuais modernos do “se dar bem”, do “fazer a fila andar”, do troca-troca de pessoas como se fossem mercadorias.

Helena e Jonathan não queriam resolver suas vidinhas através do encontro com uma pessoa idealizada, ou de escrever o livro espetacular, ou de voltar a ter 20 anos, ou de se casar com o escritor do século, ou com a maravilhosa da cidade, ou de se unir ao bem sucedido bonitão das artes, mas deixaram que o Destino guiasse seus corações, uma vez que eram donos das ricas essências que neles estavam contidos.

Mesmo que todos rissem.

Jonathan acreditava que sua falecida mulher era insubstituível, porque a amou de verdade, mesmo depois de morta, até encontrar Helena, que vibrava na mesma sintonia que a sua.

Os outros personagens apenas seguiam padrões ditados pela cultura de consumo, de aparências, enganando aos outros e a si mesmos.

Jonathan e Helena estão para o mundo das crianças, que seguem seus corações, não importando a idade cronológica que possuem.

Os outros personagens se igualam no que há de mais patético, mais superficial, que são esses valores todos aos quais se sacrificaram e que os decepcionaram depois.

Não amam nada, apenas são marionetes nas mãos de um sistema estúpido.

Eram Helena e Jonathan os verdadeiros enganados?

Será que existe mesmo uma Estrela, aquele Arcano 17, brilhando sobre a cabeça dos “lunáticos”?
Creio que sim!!

Afinal, quem é o verdadeiro lunático, depois que tudo o que é passageiro, passa?

Deixo aqui a canção-tema, desejando, com todo meu coração, que todo lunático e lunática-estelar, que todas as Helenas e Jonathans encontrem, no tempo certo, todos os seus sonhos.





Your dream comes true...

3 comentários:

  1. maravilhoso texto lunática linda

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  2. Ainda não tinha pensando esse filme por esse lado. achei um filme meio sem graça mas agora depois de ler o que voce escreveu, penso diferente.
    gostei demais, cheio de sentimento e sensibilidade.
    André ( Patos-MG)

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